Nos anos 30 e 40 do século passado, o futebol já era (parafraseando o título de um filme de Howard Hawks) o desporto favorito dos portugueses e o campeonato da 1ª Divisão arrastava multidões aos estádios (ainda sem a grandeza dos de hoje).
Num regime dominado pela bota férrea de Salazar e do Estado Novo, depois do golpe militar de 1926, o fervor clubístico ajudava a esquecer as agruras da política e o racionamento imposto pelo deflagrar da 2ª Guerra Mundial.
Embora de norte a sul do país já houvesse muitas equipas de futebol e clubes conceituados, o grande “derby” nacional era, como ainda hoje, o Benfica–Sporting, cujos adeptos mantinham uma acesa rivalidade, mas dentro dos limites da ética desportiva, sem se manifestarem com tanta violência durante os jogos, como agora infelizmente sucede, dentro e fora dos estádios.
Nesse tempo, uma das modalidades mais apreciadas pelos leitores de revistas infanto-juvenis, que também vibravam com os desafios de futebol, eram as separatas com construções de armar que tanto O Mosquito como o Diabrete, O Senhor Doutor ou O Tic-Tac lhes ofereciam generosamente, semana após semana, num caleidoscópio de imagens e de temas que apelavam ao engenho dos pequenos “arquitectos” de tesoura e cola, alguns dispostos a criar as suas próprias construções e que mais tarde se tornariam também grandes especialistas do género.
Vinham ainda longe os tempos em que outras revistas que sucederam ao Mosquito e aos seus contemporâneos começaram a inserir outro tipo de separatas, com vistosas e coloridas fotografias de jogadores e equipas de futebol. Mas, em meados de 1943, já o risonho Diabrete, dirigido por Adolfo Simões Müller, se lhes antecipara, apresentando de forma inovadora, no seu nº 132, o grande desafio de “foot-ball” (era assim que se escrevia nessa época) Benfica–Sporting, com desenhos humorísticos de Fernando Bento, a toda a largura das páginas centrais. Na página anterior eram dadas instruções aos leitores sobre os procedimentos a adoptar antes do prélio ter início, pois tinham de recortar as figuras dos 22 jogadores e do árbitro, colando-as primeiro numa folha de cartolina, depois colá-las frente com costas e montá-las em pequenas rodelas de madeira, para se manterem de pé, preparar o marcador e as bandeirinhas, arranjar balizas (com redes), um “esférico” leve e uma tábua plana, com as dimensões adequadas, para servir de campo, traçar neste as linhas de jogo e, por fim, dar início à partida, respeitando o mais possível (como rezava o Diabrete) as regras do futebol. Tais tarefas exigiam muita habilidade e esforço aos pequenos construtores, e uma boa dose de eloquência para convencerem o pai, a mãe ou um irmão mais velho a ajudá-los, mas estamos certos de que a maioria não desistiu…
Ainda hoje esse número, que foi um êxito indiscutível, é avidamente procurado pelos coleccionadores, porque nem todos os exemplares estão completos, faltando por vezes a tal página dupla com o “derby” Benfica–Sporting, que já há 70 anos punha ao rubro os entusiastas do futebol e as “claques” das duas equipas.
Aqui a têm para regalo dos benfiquistas e dos sportinguistas ferrenhos, como os meus queridos amigos José Carlos Francisco (Zeca) e Américo Coelho, a quem dedico com muita satisfação este post.